sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Só hoje

"E afinal o que eu quero é fé...
É calma...
É não ter estas sensações confusas.
Deus que acabe com isso. Abra as eclusas!
E basta de comédias em minh'alma..."
(Fernando Pessoa)

Hoje senti vontade de me organizar. Tirar a poeira da alma, passar um pano molhado nos sentimentos, limpar as gavetas do coração, jogar fora o lixo do desejo, colocar os arquivos da memória em ordem alfabética, tirar as teias de aranhas do teto da saudade. Senti vontade. Senti vontade de mandar consertar minha bússola quebrada, ajustar o relógio desse nosso tempo louco. Faxina geral em mim.
Olho em volta: a casa brilha, cheira bem. Quase tudo está em seu lugar. Não é um reflexo de mim. Tenho dentro de mim uma casa velha como o mundo, um castelo assombrado por velhas lembranças e velhos fantasmas. Incômodo? Não. Conforto. E também excitação de saber que sempre estarei descobrindo um cômodo a mais, uma porta secreta pra algum lugar estranho e novo.
Deixo tudo como está. Guardo no armário os baldes e as vassouras com os quais pretendia me limpar. Tenho preguiça de começar essa limpeza. Tenho apreço pelas minhas estantes empoeiradas e a bagunça desse meu pequeno mundo caótico que me surpreende de vez em quando.

Um comentário:

Anônimo disse...

Seria a causa de tudo isso o pequeno gole de absinto da quinta? (rs)...claro que não...
Suas inquietações são lindas.
Como resolvi descansar hoje, as minhas estão empoeiradas e guardadas num fundo falso da minha cabeça, e hoje não serão removidas (só por hoje).
Seu texto me lembrou uma frase do diário de Anais Nin (1932), que só descobri ontem: "Subtraia a superintensidade, o chiado de idéias, e você tem uma mulher que ama a perfeiçao...A perfeição é estática, e estou em pleno progresso."
Flavia