domingo, 5 de abril de 2009

"As pessoas têm que se indignar"


Em Vitória para participar do III Encontro Anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Denis Mizne, diretor executivo do Instituto Sou da Paz, deu uma entrevista muito boa ao jornal A Gazeta. Confira algumas opiniões de Denis:

"Entre 1982 e 2000, foram estabelecidos 82 novos crimes, foi criada a Lei dos Crimes Hediondos, multiplicou-se a população prisional no país, aumentou o número de policias, e qual foi o resultado? De outro lado, o discurso descompromissado da violência como conseqüência era irresponsável, porque as pessoas morrem aos milhares. Temos no Brasil mais de 100 pessoas assassinadas por dia. E quantas são roubadas, vítimas de furtos? É preciso romper com a dicotomia. A violência tem causas sociais, sim, que precisam ser combatidas, mas demanda uma agenda específica que envolve repressão de um lado, e prevenção de outro."

"(...) Assim, com uma mão nego a violência e com outra ofereço organização, trabalho comunitário, diálogo, envolvimento com esporte, trabalho, cultura. Uma política preventiva bem feita, com um bom diagnóstico, público certo, redução de acesso às drogas, de armas em circulação. Quando eu adoto esse pacote, com repressão e prevenção de qualidade, a violência cai."

"A violência é seletiva - morrem mais jovens negros, pobres, moradores de periferia das cidades -, mas o medo é absolutamente democrático, no Brasil e no mundo."

"É fundamental entender isso. Pobreza não causa nem é igual a violência. O que tem algum grau de relação com a violência? Desigualdade. A tensão entre pessoas com muito e pessoas com muito pouco; a ausência do Estado; uma sociedade de consumo que valoriza o ter, e que também valoriza a cultura da violência. Um cara andando de Ferrari ao lado de outro que não tem dinheiro para pagar a passagem do ônibus. A chance de isso dar um coquetel explosivo é enorme. Dizemos que violento é aquele cara que assalta, mas não falamos o mesmo daquele que sonega Imposto de Renda, suborna pessoas, desvia dinheiro público. Porque se a gente apontasse, de maneira séria, onde está a maior concentração de criminosos por metro quadrado, certamente falaria do Congresso Nacional. O número de congressistas acusados e processados é enorme. E ali não há pobre."

"No Brasil, falar de valor é visto como coisa de conservador. Mas nas comunidades onde a gente trabalha, vemos que quem segura muitas famílias são as mães, que não deixam os filhos desviarem. Porque a tentação é muito grande, mas a imensa maioria das famílias do Brasil está dentro da lei. Se 5% da população pobre do Brasil estivessem no crime, a elite já estaria dizimada, porque a desigualdade é brutal."

"O problema é grande, mas é preciso que cause indignação, e não impotência. Quem fica em casa só reclamando está impotente. As pessoas têm que se indignar e cobrar. Há saída, sou otimista baseado na realidade. E tem muita coisa que cada um de nós pode fazer. A gente pode ocupar os espaços da cidade, contribuir para uma vida mais coletiva. Podemos educar nossos filhos com uma cultura mais humana, de solidariedade, e não na lógica da violência, que valoriza que eles briguem na escola, que impressionem pelo tênis ou pelo relógio que usam. Na hora de votar devemos abrir mão dos nossos interesses mesquinhos, escolher bem. Cobrar resultado do prefeito, do governador, do conselho da comunidade. Exigir uma abordagem voltada para o resultado, e não para o discurso."

"Não há dúvida de que o mercado criminoso consegue agregar tanto valor à droga por ela ser proibida e ilegal, que cria uma lógica de grupos que conseguem ter acesso a armas poderosíssimas, disputar territórios de cidades e colocar em risco a própria soberania do Estado brasileiro. Ah, então legaliza? Não, mas deve-se separar o usuário leve do traficante de drogas. O tráfico de drogas, associado à lavagem de dinheiro, deve ser duramente combatido. Enquanto as drogas forem proibidas no Brasil, as pessoas que estão comprando a sua maconha, a sua cocaína, estão contribuindo para esse ciclo de mortes a que nós estamos assistindo. Não há como dissociar uma coisa da outra. O dinheiro que sai do bolso delas está gerando milhares de homicídios. Mas o problema não é só do consumidor, é também do Estado, que deve fazer o que puder para proibir a entrada da droga e das armas pelas nossas fronteiras."

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